Vá e Veja (Elem Klimov – 1985)

Uma das melhores programações em mostras cinematográficas dos últimos tempos, em Curitiba, foi a Mostra de Cinema Soviético, realizada no final de janeiro e início de fevereiro pelo Museu Guido Viara: três Eisenstein, dois Vertov, dois Pudovkin, Djovenko, Tarkovski…

Mas, a pérola, entre todos estes clássicos, foi o longa Vá e Veja de Elem Klimov, rodado em 1985. Uma verdadeira obra de arte em sua temática e construção narrativa.

A fotografia de um colorido desbotado em grande parte do filme, contrasta momentos de pouca luminosidade e cores frias, quando a realidade cruel da personagem principal a oprime e cores vivas e contrastadas quando o mesmo soldado-menino se mostra em posse completa de sua infância e entusiasmo.

Esta diferença é bem nítida quando comparadas a sequência em que as personagens dormem em uma barraca feita de ramos de árvore na chuva fria e logo em seguida quando se divertem na mesma chuva, agora pela manhã.

É nítida, também quando comparada a sequência em que os meninos encontram a arma, logo no início do filme com a sequência em que o menino volta para casa e descobre que a mãe e as irmãs foram assassinadas pelo exército nazista, assim como toda a população da aldeia.

Outro ponto alto do filme é a utilização magistral do som para a construção de sentido e para evidenciar a confusão íntima da personagem. Quando se junta aos outros aldeões, também sobreviventes do massacre ocasionado pela guerra, o menino se encontra em estado tão alterado que a trilha sonora consiste em uma constante de sons que aumentam a dramaticidade da cena e colocam o espectador em estado de desconforto.

O filme conta a história de 38 aldeias russas, queimadas pelos nazistas,  juntamente com toda a sua população, exceto aqueles escolhidos para terem um destino, que pode ser considerado pior que a morte, como o prefeito da aldeia em quem foi jogado combustível e ateado fogo e que implorava pela morte, a senhora idosa sem condições de levantar-se da cama deixada para trás para morrer lentamente ou a mulher disputada pelos soldados alemães em um dos caminhões do exército.

Expressiva é a forma de abordagem das personagens do filme e o posicionamento do cineasta no que diz respeito às relações de guerra. Os filmes nazistas, por exemplo, exaltavam a virilidade, força e beleza dos jovens soldados alemães ao mesmo tempo em que mostravam os exércitos inimigos como fracos, efeminados e indignos de vencer a guerra.

Vá e Veja, por outro lado, evidencia a crueldade do exército nazista em seu tratamento com os prisioneiros e aldeões. O comandante é colocado como esnobe e covarde, enquanto que os soldados são beberrões e desorganizados, cujo único objetivo é a diversão em trancar a população da aldeia na igreja, atear fogo na construção e metralhar as paredes enquanto o fogo aumenta e as pessoas gritam por socorro.

Outro momento, em que é evidenciada, a forma de posicionamento nazista é no texto dito pela personagem do oficial alemão que, enquanto os outros soldados e até o general imploram por perdão, afirma que as crianças aldeãs deviam morrer porque é na infância que tudo começa e os russos não tinham o direito que sua linhagem continuasse.

O menino-soldado, que precisava encontrar uma arma para ser aceito no exército russo, é apenas uma criança em meio a seu mais terrível pesadelo. Os soldados russos, por sua vez, estão desolados com a guerra e marcham puramente para se defender da crueldade dos alemães.

Este olhar fica bastante evidente na última sequência do filme, quando os alemães são capturados e, mesmo após todas as suas ações, ganham a benevolência do exército e dos aldeões russos, que os beneficiam com uma morte rápida.

Fica mais nítida, ainda, esta ética benevolente russa, na cena em que Klimov intercala planos de toda a trajetória de Hitler (iniciando com cenas da guerra e retrocedendo até uma foto de infância no colo da mãe) com cenas do menino-soldado atirando em uma foto do líder nazista, a mesma que os aldeões eram obrigados a venerar.

Apesar de conhecer todas as crueldades de Hitler e de ter presenciado os soldados nazistas subjugando a população russa, o menino-soldado não atira no Hitler-bebê.

O filme é primorosamente elaborado em seus elementos técnicos com a exploração minuciosa da luz e do som, além de uma cenografia bem construída, qualidade esta que é recorrente no cinema russo.

Mas, seu maior mérito é a exaltação implícita pela paz, feita à medida que mostra toda a crueldade e falta de sentido de uma guerra na qual as crianças lutam e morrem sem nem ao menos saber a motivação, uma guerra na qual tudo se perde.

Por Vanda Moraes

3 respuestas to “Vá e Veja (Elem Klimov – 1985)”

  1. Vanda, mt bom o texto…. e eu perdi boa parte disso tudo. Vá e veja….. eu não vi! bjw

  2. PB Produções Says:

    Oportunidade única de ver um panorama tão rico do cinema de um país. Ainda mais se considerada a importância do Cinema Soviético.

  3. crico Says:

    eu assistir este filme alem da lista de hindler que outra perola este e esplendidooooo recomendo todos verem.

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